terça-feira, 5 de outubro de 2010

NAS ENTRELINHAS


A LÓGICA DA BATATA

     Igual ás outras batatas, no feitio arredondado, esta era porém uma batata lógica. Tinha tanta lógica, tanta lógica, que se alguém dizia algo inteligente, sempre se referia à lógica daquela batata.
     Porém essa semilha bastante desenvolvida, e oriunda de uma grande cultura, foi um dia colhida de surpresa.
     Aflita e tonta com tanta reviravolta no meio das outras batatas, logo disse bem alto, para que todas ouvissem.
    - Estamos fritas. O que nem era certo.
     Quando assentou o pó, olhou em volta com os seus muitos olhos e deparou com roliças  cebolas em longas tranças, já prontas para o negócio.
     Sem perder tempo e na sua lógica, pede-lhes batatinhas. As cebolas muito emocionadas, e sempre capazes de fazer soltar as lágrimas a qualquer um, explicaram que não passavam disso mesmo, de cebolas. Como tal não lhe podiam dar satisfações.
     Na tentativa de consolar o desenvolvido, triste e lógico tubérculo, todas as cebolas lhe foram dizendo que fritas, cozidas, assadas ou esmurradas, era o destino das batatas… Aí a nossa batata, disse trémula: estou aqui estou frita.
     Toda esta preocupação teria sido evitada pela lógica da batata. Bastava que esta  soubesse que estava destinada a ser semente.
     Passou algum tempo. Foram entretanto as cebolas, despojadas das longas tranças e das cascas, (negociadas por um excelente vendedor) passaram a fazer refogado. A nossa lógica... a dar batatinhas!

                                       LUÍS CONTUMÉLIAS





3 comentários:

  1. Consigo imaginar que essas batatinhas, com tantos olhos disponíveis, juntas a uma trança de cebolas, só tinham era vontade de chorar. Também eu.

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  2. Responde-me a isto amigo Luis. O meu avÔ dizia-me :" Não comas batatas que dão sono, moço!
    A cebola é melhor, faz chorar!" E eu tenrrinho, naquele bucólico sitio do Marão pensei que a lógica era só aquela que aceitavamos comer. Apesar dos metodos impostos desde cedo que me disserem que não há lógica para nada.
    Ricardo Coelho

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